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Mulheres conquistam cada vez mais espaço no agronegócio

De uns anos para cá, elas vêm ocupando lugares em toda a cadeia produtiva do campo, desde o preparo do solo à gestão de grandes negócios rurais



Está cada vez mais distante o tempo em que ter mulheres desempenhando papéis relevantes no agronegócio era uma raridade. Quase 950 mil propriedades rurais brasileiras hoje são lideradas por mulheres, o que equivale a 30 milhões de hectares voltados à produção do agro, com 57% desse número estão concentrados na Região Nordeste, de acordo com o Censo Agropecuário, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


Embora esses dados apontem o crescimento do protagonismo feminino no setor, a verdade é que as mulheres sempre estiveram presentes no agro, mas só de uns tempos para cá conquistando destaque, ocupando lugares em toda a cadeia produtiva do campo, desde o preparo do solo à gestão de grandes negócios rurais.


A suposta falta de capacidade para tarefas tradicionalmente consideradas masculinas, a obrigação exclusiva de cuidar da casa e dos filhos, além de estereótipos que associavam as mulheres à fragilidade física e emocional, lideram as justificativas históricas, todas ligadas ao patriarcado, estão entre os motivos que até bem pouco tempo relevavam a contribuição delas também ao meio rural.


O trabalho feminino no campo era percebido apenas como uma ajuda e não reconhecido como atividade remunerada. Em muitos casos, no passado, elas atuavam como ajudantes nesses empreendimentos produtivos, conduzidos de forma tradicional, pelos pais e avós. Ao herdarem a produção, muitas romperam as porteiras da propriedade em busca de conhecimento técnico, inovação e crescimento econômico. Ao adotarem novas práticas, turbinam os lucros e alçam a produção artesanal a escalas de médio e grande porte.


A produtora Samila dos Humildes, de 30 anos, nasceu em uma das muitas famílias produtoras de ovinos em Dormentes, no Sertão do São Francisco. Desde os 12 anos, ajudava o pai com o rebanho. Como outras mulheres do agro, Samila, além de empreender, busca por formação e capacitação para ocupar espaço de liderança e alavancar os negócios. 


Samila, após participar de cursos de técnicas de produção e melhoramento genético, descobriu que a produção herdada do pai tinha potencial de ir além do fornecimento de carne para o consumo da família e de gerar um complemento de renda. Ela adotou uma série de técnicas inovadoras de manejo e catapultou os lucros para a ordem de R$ 120 mil. Com isso, adquiriu uma frota de veículos e deve percorrer grandes feiras exibindo a sua produção.


Em 2016, vencendo a resistência dos pais, ela investiu na infraestrutura para o confinamento, técnica que possibilita que os animais sejam criados e engordem mais rápido. Com o sistema semi-intensivo, em seis a oito meses, eles estavam prontos para a venda. Antes, durava até 14 meses. Dois anos mais tarde, em 2018, após realizar cursos no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Pernambuco (Sebrae-PE), ela iniciou a técnica de melhoramento genético, realizando o cruzamento de um reprodutor Pura de Origem (P.O.) da raça Dorper com as matrizes ovinas sem raça definida, o que resultou em animais com maior carcaça e mais robustos.


Samila também participou do programa Super Berro, de apoio técnico ao pequeno produtor de ovinos e caprinos, tmabém no Sebrae-PE, que garante orientação sobre produção de silagem, vacinação e o manejo do rebanho. Foi por meio do programa que ela adquiriu 30 embriões para dar mais um passo importante na sua trajetória: a produção e comercialização de reprodutores P.O. Dorper. Samila passou a inseminar os embriões nas ovelhas fêmeas, gerando machos puro sangue Dorper, que passaram a ser vendidos a outros criadores, interessados em atuar com melhoramento genético.


“Sou diretora administrativa da Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos de Dormentes (Ascod), que hoje conta com 89 homens e apenas três mulheres, e nunca tive problemas lá por ser mulher. Às vezes, quando vou à feira, vejo até pessoas admiradas por eu ser mulher, pelo trabalho que faço e o rebanho que tenho, mas preconceito, não”, explica Samila.


O sucesso dela tem inspirado a criadora de ovinos Maria Maralina, de 42 anos, também de Dormentes, que possui uma criação de ovelhas há anos, mas trabalha de forma tradicional. Com isso, todo o seu potencial de produção ainda não é aproveitado. A produção, voltada para o corte e revenda, leva em média 14 meses para ficar pronta.

Após algumas conversas com Samila, Maria resolveu iniciar a implementação de algumas mudanças no manejo do rebanho, a exemplo do uso da ração concentrada, com uma quantidade maior de proteína. Outra mudança implementada foi o armazenamento de silagem para manter a ovelha nutrida, mesmo nos períodos de estiagem.


Agricultura regenerativaTatiana Peebles, 55 anos, da Fazenda Yaguara Ecológico, em Taquaritinga do Norte, no Agreste, que atua na agricultura regenerativa, é outro exemplo de mulher bem-sucedida no agro. À frente da administração da propriedade com o pai dela, David, o fundador do negócio, e do marido, Juscelino, conquistou notoriedade e credibilidade no mercado pelos cuidados que mantém na produção de café, mel e presunto cru, este último a estrela da fazenda, inspirado no pata negra espanhol, iguaria típica do país ibérico. Não por acaso, o produto está na mesa de grandes chefs da cozinha nacional.


A Yaguara já acumula vários prêmios, inclusive, em 2021, Tatiana entrou para a lista das 100 Mulheres Poderosas do Agro, da revista Forbes Brasil. Na Yaguara, ela é responsável pela produção, contabilidade, Recursos Humanos, redes sociais, prospecção de clientes, vendas e entregas.


“Nunca tive problemas com meus clientes por ser mulher. Acho que por eu ser uma pessoa muito franca, falo logo o que eu acho e tento tratar as pessoas com o maior respeito, coisas que meu pai me ensinou”, afirma Tatiana. A empresária acrescenta que o acúmulo das tarefas domésticas com o trabalho na fazenda nunca foi um problema, porque sempre contou com o marido também nas questões que envolvem a casa.  


De acordo com a analista para o setor de agro do Sebrae/PE em Petrolina, Heloísa Nóbrega, o mundo do agro, embora seja predominantemente masculino, tem ganhado cada vez mais a adesão das mulheres. “Às vezes, elas ficam em um segundo plano, não aparece tanto, mas estão superenvolvidas na atividade como produtora rural, principalmente na agricultura familiar. Quando a gente faz visitas, percebe que elas, muitas vezes, acumulam função como dona de caça e trabalhando na roça”, afirma Heloísa.



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